Análise da legislação comparada dos Estados Federados, buscando-se reunir propostas úteis para se aperfeiçoar o projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental.
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Licenciamento Ambiental no Brasil
Análise da legislação comparada dos Estados Federados, buscando-se reunir propostas úteis para se aperfeiçoar o projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental

É incontestável que, em 2019, o assunto ‘meio ambiente´ tem ocupado grande espaço na mídia nacional. No entanto, debates sobre o tema já ocorrem há décadas no Congresso Nacional, bem como em Assembleias Estaduais.

Para exemplificar a afirmação acima, cita-se a Lei Complementar 140, que fixa normas relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, bem como à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas, e à preservação das florestas nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum. A referida lei, que pretendeu definir a forma de cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, teve sua tramitação legislativa iniciada no Congresso Nacional em 2.003. Apenas em 2.011 o Congresso Nacional enviou o seu texto à sanção presidencial.

Do mesmo modo, o Código Florestal Brasileiro foi aprovado apenas em 2.012, após inacreditáveis 13 (treze) anos de análises e discussões.

Na realidade, a discussão da política ambiental brasileira já ocorre há muitos anos, acentuando-se após a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 (“CR/88”).

Outra questão que já vem se arrastando há anos no Congresso Nacional é a da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que tem por finalidade estabelecer regras claras e padronizar, na medida do possível, os critérios a serem adotados pelos Estados e Municípios na definição dos procedimentos relativos à regularização ambiental de atividades potencialmente poluidoras, ou utilizadoras dos recursos ambientais.

Não é objetivo deste texto adentrar em questões teóricas ou principiológicas relacionadas ao desenvolvimento sustentável, à preservação dos recursos ambientais, à garantia da livre iniciativa, ou da dignidade humana.

O foco do trabalho é tão somente apontar para a existência de boas iniciativas e práticas adotadas pelos Estados que poderiam ser absorvidas – ou ao menos incentivadas e não vedadas – pelo Projeto de Lei n. 3.729/04, em discussão no Congresso Nacional.

Em verdade, um estudo comparativo da legislação ambiental dos Estados demonstrou que existem práticas que já se mostraram realmente eficazes. Estas iniciativas advêm da experiência de cada Estado na busca por procedimentos que atendam, de forma simultânea, princípios como legalidade, probidade administrativa, supremacia do interesse público, celeridade, finalidade, razoabilidade, proporcionalidade, impessoalidade, igualdade, publicidade, eficiência, devido processo legal e ampla defesa.

Em todos os Estados analisados, verificou-se que há espaço para aperfeiçoamento da legislação ambiental.

Em muitos Estados, algumas dificuldades assemelham-se. Cite-se, a esse propósito,  a necessidade de modernização da infraestrutura e do incremento do número de técnicos dos órgãos ambientais licenciadores.

Outro ponto que ainda é insuficiente em praticamente todos os Estados pesquisados, está relacionado à manifestação de órgãos externos ao processo. De fato, verificou-se a importância de se criar procedimentos céleres e adequados para manifestação dos órgãos intervenientes no processo de licenciamento ambiental, sendo indispensável o cumprimento do prazo legal de resposta.

Por outro lado, algumas práticas merecem atenção especial em suas análises, devendo ser, eventualmente, replicadas na legislação federal ou em normas dos demais Estados da Federação.

Nesse contexto, sobreleva destacar que o Estado do Espírito Santo adota o instrumento de renovação automática da Licença de Operação, desde que atendidos requisitos como o cumprimento de todas as condicionantes e a manutenção das condições referentes ao meio e ao monitoramento das atividades.

A renovação da licença dar-se-á automaticamente, de forma online.

Este procedimento ainda pode ser aprimorado/ampliado para possibilitar a renovação automática das Licenças Prévia e de Instalação, mesmo que dependam de eventual realização de Auditorias Ambientais em situações específicas.

Já no Estado de Goiás, existe previsão legal para a regularização espontânea de empreendimentos em funcionamento, sem licença ambiental. Nestes casos, o empreendimento irregular que se apresentar espontaneamente ao órgão ambiental em busca de seu licenciamento, tem a possibilidade de não receber autuação por falta de licença ou de ter uma redução significativa no valor da multa eventualmente aplicada.

Lado outro, no Estado de Mato Grosso do Sul, foram adotadas medidas desburocratizantes na recepção de documentos no âmbito dos órgãos ambientais, tais como a dispensa do reconhecimento de firmas e autenticação de cópias, a vedação a solicitação de documentos e informações já disponíveis no processo, a possibilidade da entrega de documentação de forma online, dentre outras.

O Estado da Bahia inovou com a criação de procedimentos simplificados para a concessão e renovação de licenças ambientais no tocante às atividades e empreendimentos que implementem Programas voluntários de gestão ambiental e práticas de Produção mais Limpa (P+L).

Em Mato Grosso, tornou-se obrigação legal a previsão orçamentária dos órgãos licenciadores para capacitação contínua dos técnicos ambientais.

O Distrito Federal, por sua vez, saiu na frente ao vincular o processo de licenciamento ambiental ao Sistema de Registro e Licenciamento de Empresas. Desse modo, para os empreendimentos que contenham somente atividades econômicas e/ou auxiliares classificadas como de baixo risco no Sistema de Registro e Licenciamento de Empresas (RLE), não é necessário o protocolo de requerimento de licenciamento ambiental, devendo o interessado respeitar as condições, exigências e restrições estabelecidas para sua atividade. O interessado deve, também, cumprir as declarações assumidas e o disposto na  legislação ambiental.

Outra questão importante – enfrentada por Santa Catarina e São Paulo -, foi a criação de regulamento específico e detalhado sobre a contagem dos prazos dos procedimentos de licenciamento, regulando-o desde o protocolo e definição da equipe de análise, até a data da vistoria, conclusão do Parecer, publicação da licença, e outros procedimentos.

Minas Gerais, por sua vez, criou uma legislação moderna e objetiva ao possibilitar a emissão de licenças unificadas para determinadas atividades. Embora seja o único Estado, até o momento, a incluir o critério locacional do empreendimento para definição dos procedimentos e estudos a serem adotados – o que poderia, a princípio, tornar o processo mais complexo e demorado – tem-se demonstrado que a padronização de regras, e  discussões eminentemente técnicas levam a respostas eficazes, conferindo maior segurança jurídica a todas as partes.

Relevante, ainda, destacar os esforços da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais no sentido de implantar sistema informatizado de formalização, gestão e desenvolvimento do procedimento de licenciamento ambiental, fato este que se mostra fundamental para se conferir agilidade, transparência e efetividade ao processo.

Outra inovação mineira foi o lançamento do Programa de conversão de multas ambientais, uma importante ferramenta associada às práticas de resolução consensual de conflitos, permitindo que ao autuado – e principalmente ao meio ambiente – soluções céleres e eficazes.

Enfim, estas e outras questões têm se mostrado adequadas ao bom desenvolvimento das atividades administrativas relacionadas ao processo de licenciamento ambiental, razão pela qual poderiam ser absorvidas pelos demais entes federados ou mesmo no Projeto de Lei n. 3.729/04.

Assim, considerando-se a existência do mencionado Projeto de Lei n. 3.729/04, que, repita-se, objetiva traçar regras e critérios gerais para o licenciamento, parece-nos evidente que há uma ótima janela de oportunidade para que estas práticas positivas, já testadas pelos Estados, sejam verdadeiramente incentivadas, quer seja em âmbito federal, quer seja pelos Estados, de forma equânime.

Concluindo-se, vale reproduzir a fala do Secretário de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento de Minas Gerais, Dr. Germano Vieira, em debate na Câmara dos Deputados durante a discussão do Projeto de Lei n. 3.729/04:

“O descrédito do licenciamento ambiental, tal como está exposto, só interessa aos segmentos retrógrados do setor produtivo que, na verdade, desejam uma licença para poluir, e a determinados setores da sociedade, que, por razões ideológicas, se valem do instrumento para fazer um debate político que extrapola a sua finalidade. Não podemos ter um mundo normativo completamente desalinhado com a necessidade de evolução rápida que o ecossistema da tríade Empresas, Sociedade e Governo exige”.

Ainda há muito para se evoluir, especialmente no entendimento geral da finalidade deste instrumento da Política Ambiental.

Espera-se, contudo, que o Congresso Nacional tenha, por seus Deputados e Senadores, maturidade, senso de urgência para regulamentação do licenciamento ambiental, discernimento e muita responsabilidade na discussão e aprovação deste importante marco regulatório estruturante para um País sedento por crescimento sustentável e oportunidades para todos.

Paula Meireles Aguiar, advogada especialista em Direito Ambiental.
Fábio Figueiredo, advogado e doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa/Portugal.